Maio é o mês destinado às campanhas de conscientização, de prevenção e de combate ao assédio moral nos setores público e privado, tendo como marco o dia 2, Dia Nacional de Combate ao Assédio Moral. O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) define o assédio moral como o processo contínuo e reiterado de condutas abusivas que, independentemente da intencionalidade, degradam as relações socioprofissionais e do ambiente de trabalho; exigem o cumprimento de tarefas desnecessárias e/ou exorbitantes; e abarcam discriminação, humilhação, constrangimento, isolamento, exclusão social, difamação e/ou abalo psicológico.
O assédio moral afeta as relações da vítima, consigo mesma e no ambiente laboral, e causa danos ao erário público, eis que, não raramente, é deferido um sem-número de afastamentos por adoecimento do servidor e de aposentadorias por incapacidade, além de risco acrescido à conduta atentatória à própria vida, em suma, o suicídio.
No setor público, considerando que grande parcela dos servidores é dotada de estabilidade, é comum que o assédio moral aconteça de formas horizontal (entre profissionais da mesma hierarquia), vertical (por superiores hierárquicos), de maneira ascendente (por servidores contra superiores hierárquicos) ou de forma mista (por colegas de trabalho e superiores hierárquicos).
Muitos são os fatores para que as vítimas não denunciem o assédio moral, sobretudo nas repartições públicas, como medo, vergonha e impotência, só para citar algumas possibilidades. Contudo, o principal motivo recai na não existência de canais adequados para o compartilhamento da acusação, e de política organizacional de atenção e de apoio a quem sofre a modalidade desta violência. E mais: ainda não se tem a consciência de que o responsável pelo assédio não é apenas o autor direto da conduta atentatória à dignidade da vítima, mas, sim, todos os que a presenciam e nada fazem para impedi-la. Pelo contrário: até se afastam da vítima pelo receio de serem prejudicados, ou alvo do assediador.
É indiscutivelmente urgente a implantação de políticas de gestão institucional que visem ao apoio de quem sofre o assédio e a eliminação do risco da vitimização, seja pelo monitoramento dos afastamentos por abalos na saúde física e psicológica, especialmente no âmbito do Ministério Público (MP) e do Poder Judiciário, seja promovendo campanhas de conscientização e lançando mão de canais externos e independentes para denúncias.
No Estado de São Paulo, o assédio moral é infração administrativa grave punida com demissão a bem do serviço público. Porém, as estatísticas a respeito do tema são inexistentes, sendo comum a revitimização do servidor ou agente político que ousa se insurgir contra as condições precárias ou abusivas de trabalho.
Diante dessa triste realidade, devem ser criados observatórios com abrangência nacional dos casos constatados, direta ou indiretamente, bem como adotar política de valorização dos servidores e de fomento ao trabalho em rede que estimule a criatividade e as boas práticas. Também é necessário que seja adotado o afastamento compulsório e cautelar do responsável pela violência.
Hoje, as vítimas é que são obrigadas a se removerem de seus postos de trabalho pela situação, muitas vezes, insuportável e de isolamento patrocinada pelos assediadores, até como forma de resgate da dignidade e da autoestima e de manutenção da saúde que lhes restam.
A reparação da vítima violada deve ser objetivo a ser perseguido pelos entes públicos, tais como o desagravo de quem foi submetido a assédio organizacional, o incremento de práticas restaurativas fomentadoras da superação do trauma e da formação da resiliência, bem como ações afirmativas em prol da justiça social.
E, não menos importante: só vamos avançar nesta temática quando também for eliminada a segregação vertical de mulheres em postos de poder e de liderança. Há de se olhar com atenção para a adoção de medidas de equidade racial e de respeito à identidade de gênero no ambiente laboral – uma afronta para alguns, imagino – mas imprescindível para o progresso ao respeito no expediente da rés pública.
* Celeste Leite dos Santos é doutora em Direito Civil; mestre em Direito Penal; promotora de Justiça; coordenadora do Grupo de Estudos de Gênero do Ministério Público (MP) de São Paulo; presidente do Instituto Pró-Vítima; coordenadora da revista internacional de Vitimologia e Justiça Restaurativa; e idealizadora da lei federal de importunação sexual, e do Estatuto da Vítima
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